segunda-feira, 2 de maio de 2011

Vamos voltar a aplicar a Lei Seca?

Partindo do pressuposto de que “bebida e direção não combinam”, foi editada em junho de 2008 a denominada Lei Seca que, alterando o Código de Trânsito Brasileiro, considerou gravíssima a conduta de dirigir sob a influência de álcool e impôs, como penalidades administrativas, uma pesada multa e a suspensão do direito de dirigir por 12 meses. No âmbito criminal, essa mesma legislação vedou benefícios para aqueles que, estando embriagados, praticassem delitos na direção de veículo automotor, tornando possível, em caso de morte da vítima, a classificação do crime como homicídio doloso.

Segundo pesquisas publicadas, nos dois primeiros meses de aplicação da Lei Seca, entre julho e agosto de 2008, houve uma redução de 24% no número de mortes no trânsito em todo o Brasil, além de uma diminuição de 35% nos atendimentos de socorro da rede SAMU – uma clara demonstração de que tal lei, se cumprida, é eficaz, sendo apta não só a salvar vidas, mas também a promover economia para os cofres públicos.

Contudo, após quase três anos de vigência, a realidade que vivemos é bem diferente: a fiscalização do cumprimento da Lei Seca é mínima e a prevenção da prática de crimes de trânsito por quem faz uso de bebida alcoólica é praticamente inexistente.

Atualmente, só damos conta dos males que o uso indiscriminado do álcool ocasiona quando o resultado danoso já aconteceu, quando uma tragédia estampa os jornais e o triste resultado é irreversível. Então, todos clamamos por justiça e pedimos a aplicação da lei – a mesma lei que, simplesmente, já esquecemos de cumprir!

Ora, é sabido que o álcool é tão ou mais nocivo que o cigarro e, no entanto, toda a política pública é voltada para o combate ao fumo! Embora não seja dada a tal vício, acompanho, há algum tempo, as restrições, cada vez mais severas, impostas aos fumantes, as propagandas chocantes e as advertências destacadas de que “fumar é prejudicial à saúde”. Em contrapartida, a veiculação escancarada de marcas de cerveja na televisão, por exemplo, deixa claro que o poder público faz “vista grossa” para todos os problemas que advem do uso irrestrito (e incentivado) de bebida alcoólica. Não se reconhece que o mesmo estabelecimento que é duramente multado pela presença de fumantes em suas dependências exibe freqüentadores assíduos, que não sabem o momento de dizer não ao garçom que traz o próximo chope.

Ressalta-se, ainda, que o álcool é desencadeante de muitos outros problemas de ordem social, entre eles a tão falada violência doméstica e familiar contra a mulher. E, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a porcentagem de mortes advindas do consumo de bebida alcoólica é maior do que as causadas por aids, violência e tuberculose. Por tal motivo, inclusive, o Brasil já se comprometeu, perante a comunidade internacional, a adotar medidas e restrições à comercialização de bebidas alcoólicas, estando entre elas o aumento da tributação de tais produtos. Infelizmente, quase nada saiu do papel...

Nos últimos meses tem sido freqüentes as notícias sobre homicídios praticados por jovens embriagados na direção de veículos automotores. Na mesma proporção, multiplicam-se as denúncias em que são classificados como dolosos (intencionais) os crimes praticados no trânsito por condutores que fizeram uso de bebida alcoólica. O que antes constituía um exemplo inusitado das aulas de Direito Penal, tornou-se praticamente regra: quem comete um homicídio no volante, tendo feito uso de álcool, assume o risco de produzir a morte de terceiros e, portanto, deve ser levado a julgamento pelo Tribunal do Júri.

Não se discute neste momento se está certo ou errado tal entendimento, mas não se pode deixar de reconhecer que a fiscalização ao cumprimento da Lei Seca deve continuar, ainda que se adotem campanhas de conscientização e se promovam medidas para aprimorar a educação no trânsito.

Sinceramente, parece-me hipocrisia pensar que a prevenção ao cometimento de crimes na direção de veículo automotor, em razão do consumo de bebida alcoólica, não precisa estar atrelada ao cumprimento da lei. Entender dessa forma implica em visualizar apenas as conseqüências do problema, descurando-se de suas causas. Significa enxergar a morte no trânsito apenas como um fato que precisa ser punido, mas que não precisa ser, necessariamente, evitado! Daí o apelo: vamos voltar a aplicar a Lei Seca?

3 comentários:

  1. Excelente texto. As pessoas precisam entender que a lei não proíbe ninguém de beber à noite: a proibição é a de dirigir depois de beber! Quer beber? Saia com os amigos e peça que o sóbrio leve o carro, oras. O problema ainda é o egoísmo das pessoas em fazer o que querem sem se importar com os estragos que poderão causar a terceiros. Grande abraço!

    ResponderExcluir
  2. Ótimo artigo Professora. Realmente a lei já caiu em desuso. Daqui um tempo acontecerá algum fato grave e aparecerá outra medida paliativa facilmente trabalhada na política legislativa. Uma solução que pode ser dada a bebida, como aconteceu com o cigarro, é a de tributar ainda mais o produto. Há pouco tempo um maço de cigarro não custava R$2,00, hoje um de mesma marca já custa R$4,75. Mas acredito que a bebida não tenha sofrido o mesmo aumento.

    ResponderExcluir
  3. Excelente lembrança minha eterna Professora! Estou com saudades. Na época, esta Lei foi tão exaltada, justamente por diminuir significantemente o número de acidentes com vítimas fatais no trânsito.
    Na minha humilde opinião, isto se deu, exatamente pela atividade de fiscalização preventiva por parte do poder público, ou seja, a aplicação na íntegra da Lei Seca. Aliar a prevenção com a aplicação da lei é essencial, e assegurar esse direito é um dever de todos, não deixando cair no esquecimento, ou seja, vamos abrir nossa boca, protestar, só assim, o BRA pode mudar.

    ResponderExcluir